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ABEPSS assume o compromisso com ações de combate ao racismo

16/07/2021

Entidade compreende a relação entre as lutas anticapitalista e antirracista, e reconhece a urgência do debate étnico-racial no contexto da formação graduada e pós-graduada


 
A formação da sociedade brasileira é marcada por uma estrutura racista, que precisa ser combatida dia após dia com ações de mudança estrutural. A ABEPSS tem avançado no debate dessa questão, compreendendo a relação entre as lutas anticapitalista e antirracista, e reconhecendo a urgência do debate étnico-racial no contexto da formação graduada e pós-graduada, bem como do trabalho profissional - numa perspectiva de indissociabilidade entre essas duas dimensões.

Ainda há a necessidade de debates e de preencher lacunas que persistem no campo da formação e do trabalho profissional. Entre as ações de combate ao racismo construídas pela ABEPSS recentemente, merecem atenção os materiais “Subsídios para o debate sobre a questão étnico-racial na formação em Serviço Social “ e “As cotas na pós-graduação: orientações da Abepss para avanço do debate”, ambos elaborados pela gestão “Quem é de luta resiste” (2017-2018).

Em 2010, a ABEPSS criou o Grupo Temático de Pesquisa (GTP) “Serviço Social, Relações de Exploração/Opressão de Gênero, Feminismos, Raça/Etnia e Sexualidades”, que tem o propósito de avançar em produções e pesquisas na área do Serviço Social, tanto no âmbito da graduação quanto da pós-graduação.
“Tais produções expressam o acúmulo e a coerência ético-política com o projeto de formação e profissão defendidos pela entidade, apontando as principais lacunas e desafios que ainda precisamos superar mas, especialmente, dando elementos e subsídios para a categoria superar tais lacunas no cotidiano das Unidades de Formação Acadêmica (UFA’s), considerando a função precípua da ABEPSS de guardiã e defensora do projeto crítico de formação profissional construído pelo Serviço Social renovado, que se expressa nas Diretrizes Curriculares de 1996”, explicou o representante nacional de discentes de pós-graduação, da executiva nacional da ABEPSS, Tales Fornazier (PUC-SP).

Para Fornazier, tais documentos, em especial os Subsídios, devem ser a bússola da associação, para instigar cotidianamente a elaboração de estratégias que qualifiquem a formação e o trabalho, possibilitando a construção de competências teórico-metodológicas, ético-políticas e técnico-operativas efetivamente antirracistas. “É essa direção que nos possibilitará viabilizar uma formação que propicie a apreensão do processo histórico como totalidade”, destacou.
Já no trabalho profissional, o Serviço Social teve avanços significativos, como a incorporação dos princípios éticos e políticos no Código de Ética Profissional (1993), que estabelece o compromisso com a eliminação de toda e qualquer forma de preconceito e discriminação.

Virada
Em 2003, o Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) criou a campanha de combate ao racismo “O Serviço Social mudando o rumo da história”. Já em um contexto mais recente, o conjunto CFESS-CRESS criou a campanha “Assistentes Sociais no combate ao racismo” (2017-2020) que possibilitou uma “virada” no interior da profissão.

Em 2010, durante o 39º Encontro Nacional do conjunto CFESS/CRESS, realizado em Florianópolis-SC, a categoria profissional assumiu a posição favorável às políticas de ações afirmativas, bem como à descriminalização e legalização do aborto. São as mulheres negras que mais têm complicações e mais morrem com a realização de abortos inseguros.  Cnforme o IBGE, em mulheres brancas a taxa é de 3 óbitos causados por aborto a cada 100 mil nascidos vivos, entre as negras esse número sobe para 5. 

“Essa luta vem de longe”
Dentro do âmbito profissional, essa trajetória de luta contra racismo foi iniciada há décadas, com o pioneirismo de um movimento criado por assistentes sociais negras que também eram militantes no movimento negro e de mulheres, e que reconheceram a ausência desse debate na profissão. 
Essas assistentes sociais passaram a se organizar para apresentar a temática racial no VI Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais (CBAS), maior evento da categoria profissional, em 1989. O congresso marca o início dessa discussão no interior da categoria.
Trabalho profissional e combate ao racismo

Apesar da trajetória de luta, no trabalho profissional das/os assistentes sociais há vários sinais do preconceito racial na relação com as/os usuárias/os, como no tempo de espera para determinados serviços, na qualidade da informação, o que se fornece e o que não se fornece aos usuários, no modo como são atendidas as demandas, entre outras marcas, conforme explica a assistente social, professora e ex-presidente do CFESS no triênio 2017-2020, Josiane Soares Santos.

Durante a gestão em que Josiane esteve à frente do CFESS, a entidade criou a campanha “Assistentes Sociais no Combate ao Racismo”, que ressaltou a importância do papel de cada assistente social no combate ao racismo em seus locais de trabalho. Na avaliação da docente, a ação foi um “momento histórico para o Serviço Social Brasileiro”.

"Acho que foram muitos saldos positivos chamando a atenção para o papel que cada assistente social tem no combate ao racismo no seu local de trabalho, seja ele na formação, seja ele no exercício profissional. Mais do que uma campanha, eu acho que mudou, de algum modo, a cultura profissional. Eu mesma posso dizer que, no meu trabalho docente eu estudo questão ambiental, mas eu não consigo estudar a questão ambiental hoje sem notar a variável racial, por exemplo, no impacto socioambiental de determinadas obras, de determinadas situações, que estão associadas a crise ambiental, que ela não atinge a todos na mesma proporção”, destacou Josiane.

O debate racial na formação
Também é preciso avançar no debate da questão racial na formação. A estudante de Serviço Social Maria Fernanda de Aguiar Azevedo (Unifesp), aponta os desafios da graduação, que vão desde o currículo, como nos casos de docentes que não apresentam a temática racial, até a convivência nos espaços coletivos.

"Tem uma autora chamada Luciana Alves. Ela fala do valor da brancura. Em um certo momento, ela fala dos olhares, que os olhares doem bastante. Às vezes, a gente prefere andar de cabeça baixa dentro da instituição", explicita Maria Fernanda.

No que diz respeito ao currículo, a estudante ressalta que é possível perceber a dificuldade de professores trabalharem com autores negros, de ver o recorte racial, e de ampliar algumas discussões que impactam na formação. “Tem autores pautando a questão racial no serviço social há muito tempo, e pouco se vê professores trazendo essa temática. Começou um movimento legal de alguns professores, que eu estou acompanhando, que estão fazendo essa busca por autores e da temática, e pra mim foi muito surpreendente, mas não são todos os docentes que trazem, e nem todas a UFA’s”, destacou.

Maria Fernanda, que também faz parte da representação estudantil da ABEPSS, pela regional Sul II, destaca que o movimento estudantil é importante e está na vanguarda dessa luta, e que os cadernos de deliberação da executiva têm propostas de ações desde 2005.

Ela encerra ressaltando as discussões que deveriam ser feitas para uma formação antirracista. “As diretrizes da ABEPSS estão explícitas, pensar nos eixos temáticos, fazer o resgate dos autores negros. E para uma ação antirracista, a gente tem que tratar de branquitude, entender a sociedade brasileira como racializada. O que é branquitude, e que lugar ela ocupa? É preciso um esforço. Discutir de forma rasa, não é uma formação antirracista”.

Compromissos da ABEPSS com a formação antirracista
Na continuidade do acúmulo que vem sendo forjado no interior da entidade, a gestão Aqui se respira luta!, desde a composição da chapa e construção do plano de gestão, tem tratado desse debate e se proposto a dar continuidade a essa discussão com uma centralidade importante da agenda política.

“A própria plataforma da chapa é exemplo desse compromisso, uma vez que deixa nítida a preocupação desta gestão no adensamento desse debate e com as lutas dos povos negros, indígenas, quilombolas, bem como outras pautas anti-opressões”, explicou Tales Fornazier (PUC-SP).

O representante de discentes detalha as propostas de ações da ABEPSS para avançar no debate da questão racial no interior da categoria, que foram definidas no planejamento da gestão. São elas:

I) o adensamento dos Subsídios para o debate sobre a questão étnico-racial na formação em Serviço Social, no âmbito da graduação e pós-graduação;
II) a proposta de fortalecer a implementação de políticas de cotas para acesso e permanência nos PPGs;
III) a orientação para uma ampla revisão programática na estrutura curricular dos programas de pós-graduação em Serviço Social, com a inclusão de autores/as negros/as/es nas disciplinas e demais atividades programáticas contribuindo, assim, para a ruptura do apagamento da produção intelectual negra;
IV) a construção de uma Plataforma Antirracista no site da ABEPSS, que servirá como espécie de um repositório com indicação de bibliografias sobre a questão étnico-racial;
V) avançar no debate sobre a questão etnico-racial junto às UFAs e finalizar o documento do levantamento realizado sobre o debate da questão étnico-racial;
VI) além das constantes notas, construção de matérias e posicionamentos políticos, como por exemplo esta matéria e a que está sendo construída para o dia 25 de julho em que é comemorado o Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha e outras que o próprio movimento do presente apontar.

Confira também outros debates realizados pela ABEPSS:
Lives do projeto ABEPSS AO VIVO:
O debate étnico-racial e a formação profissional em Serviço Social;

O racismo estrutural e suas expressões nas violências contra negros/as;

Questão Social e Precarização do Trabalho no Brasil;
 
Apropriação do tempo das mulheres: trabalho, maternidade e militância;
 
Notas políticas e posicionamentos:
Contra o racismo, sigamos por novos Palmares!
 
Nota da ABEPSS em defesa da luta antirracista
 
ABEPSS Sul II repudia racismo contra estudante de Serviço Social da UNIFESP
 
 

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